Sê brando comigo.
Não escolhi ser
assim.
Gostaria de poder
dizer que sou este e aquele, mas afinal de contas, sou mesmo isso, nada.
Um nada que é um
todo. Um todo cheio de vazio no seu interior.
Estou partido em
vários pedaços, retalhos de uma ideia, de um pensamento.
Mas até a praia
paradisíaca é composta por mil grãos de areia.
Eu não escolhi
ser assim.
Não escolhi ter o
reflexo que vejo na poça de água.
Não escolhi sentir isto, ou aquilo, ou nada.
Não escolhi
fechar os olhos quando não queria ver.
Não escolhi amar,
nem morrer.
Não provarei a
dor que há em mim.
Deixarei passar
como faz uma bela espectadora
Deixarei o vento
soprar, pois ele sabe para onde vai e eu não.
Deixarei a chuva
molhar e lavar o tempo.
Eu não escolhi
ser assim.
Um todo que é
nada constantemente.
Um chorrilho de
disparates com sentido,
Um novelo sem
ponta ou fim, emerenhado em si próprio,
Sofucado pelo seu
próprio peso,
Em toneladas de
pensamentos turvos,
Outros escuros e
outros ainda mais escuros.
Eu escolhi ver.
Escolhi ouvir. Escolhi provar.
Escollhi fazê-lo
em frente, sem que paisagens de trás me distraissem.
Quando me voltei,
segui em frente.
Não deixei mais
espaço ao olhar, nem ao pensar.
Porque se
chorasse mais, faria oceanos.
Se pensasse mais
escreveria livros.
Se me demorasse
mais, não daria passos.
Eu não escolhi
ser assim.
Não escolhi
aceitar a dor em vez de a viver, ainda que a viva todos os dias.